Tradições da Minha Infância
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Nasci no Baixo Alentejo num pequeno povoado / em ambiente rural / Com algumas tradições que marcaram / a minha e muitas outras gerações!
Algumas, eu não vivi, mas cito-as porque as ouvi
descritas pelos mais velhos,
Para integrarem a história e ficarem na memória
Dos que nasceram ali!
Aos Pais, aos avós e tios era pedida a Benção
Indo beijar-lhes a mão.
Os Pais eram tratados por um formal vossemecê
e inspiravam tal respeito
Que nunca se punha em causa, um seu, contundente, Não !
O luto pelos mais queridos no vestuário se mostrava
a viúva, para sempre
Só de preto trajava…com saia até meio da perna,
meia preta e opaca.
Na cabeça, o lenço preto apertado em rebuço
Nem o sorriso mostrava.
E num período inicial sobre a cabeça ou ombros
Um xaile negro, ainda mais, sua dor sublinhava!
A nível alimentar, não era pra todos igual,
Mas para os que podiam
Havia as iguarias próprias pra dias de Festas
Como a Páscoa ou o Natal!
De entre muitas, as filhós, eram mesmo as rainhas.
Recordo as de minha Mãe: deliciosas e tenrinhas!
Na manhã de Carnaval pra acompanhar "o café"
uma rica friginada,
Frita, numa sertã, ao lume na chaminé!
Uma mistura de carnes - de porco - era envolvida
em vários ovos batidos
Cujo sabor e aroma eram festa p'ros Sentidos!
Ao nível da diversão, foram na região,
famosas as Cavalhadas,
Um jogo de sorte e azar: Várias panelas de barro
eram expostas num varal
E entrava no jogo um Homem montado num animal!
*"Na Quarta -Feira de Cinzas, a correr em seus jumentos
os inscritos procuravam
Com varapau acertar na panela que continha
Um frango para guisar!
Um jogo bem divertido, mas que exigia perícia
e acerto na premiada
Pois várias continham cinzas, que sobre eles se espalhavam,
Sempre que alguma dessas, fosse a panela quebrada"!
Na Páscoa, p'la noite fora, havia o Baile da Pinha
que terminava quando um par
A fita certa puxava e a pinha rebentava
Dando assim a conhecer, os novos, Rei e Rainha!
O mastro de S. João, feito pelas raparigas
Garantia animação durante noites seguidas:
"Com bailes abrilhantados pelo som da concertina
ou quando esta faltava
Ao simples som de flauta ou, mesmo só, de cantigas"!
O cante tradicional era cantado p'los homens
na taberna diariamente,
Entre rodadas de copos: de vinho ou de aguardente!
A matança do porco era também tradição
e no final distribuía-se
P'los vizinhos mais próximos, carne para a refeição!
A farinha para o Pão no Moinho era comprada
e depois de peneirada
E p'las Mães amassada era muito bem tapada
para poder levedar…
Depois de estar levedada, belos pães eram "tendidos"
E em grandes fornos de lenha eram depois bem cozidos!
E era a base da alimentação esse delicioso Pão!
E a tradicional açorda, lá ia então alternando
Com o bom "jantar" de couve e o de feijão ou de grão!
Era diferente a maneira de as refeições nomear:
o pequeno
almoço, era o café
O jantar era o almoço, o lanche era a
merenda
E a ceia era o jantar!
Por isso hoje, eu recordo com alguma emoção
Que era frequente ouvir-se responder à pergunta:
O que é hoje o almoço? - É um "jantar" de feijão!
Toda a roupa das famílias, na ribeira era lavada
Pelas Mães ou Lavadeira. A branca "corava" ao sol!
Depois com ferro a carvão, era muito bem passada!
A água vinha do poço em Quartas de barro
Que a mulher assentava na cabeça, com "rodilha"
E a perícia era tal, que ela seguia segura e apesar da altura,
A quarta equilibrava e nada corria mal!
O namoro era à janela com a mãe sempre por perto
Não fosse o namorado, resolver, "armar-se em esperto"!
E no dia do casamento os noivos quando chegavam
Da igreja, já casados, (Ao entrar no povoado)
Para alegria das crianças atiravam rebuçados!
As crianças brincavam, livremente pelas ruas
E quando os campos se vestiam com coloridas flores
Colares de várias cores
Enfeitavam as meninas, claro… as mais pequeninas
Que ficavam uns amores!
Leonor Alvito, 1 de fevereiro 2025
Nota: o texto foi escrito segundo o antigo acordo e foram mantidos os "termos usados na época".
As tradições descritas referem-se ao lugar, onde a autora nasceu e cresceu até aos 10 anos.
*in,Homenagem ao Mestre…. , poema de Leonor Alvito, 2024