Poesia # 52 - Estrela da Manhã
Vejam o absurdo, pensou o Comandante, a estrela da manhã é afinal um planeta, e a pandemia será, tudo indica, uma endemia, daqui a poucos meses.
O que fazer com a nave que nos transportou durante estes dois anos? O que fazer com estes dois longos anos?
Terá chegado o tempo em que finalmente as máscaras cairão, em que as estrelas voltarão a ser simples luzes brilhantes no firmamento, em que o ar será partilhado.
Afinal
Vénus tem duas faces num único corpo. De noite é planeta, ao despertar
chamam-lhe estrela, a única teimosa no céu do amanhecer, antecipando o nascer
do Sol, anunciando a passagem das trevas para a luz, dando a direção do
nascente, o renascer dum novo dia. Nascemos e logo as nossas vidas ficam
ligadas por um fino fio que começa em Vénus e acaba na estrela da manhã. Um fio
invisível, mas verdadeiro que esteve presente durante estes anos, das terras do
sol nascente, até às terras onde o sol se deita, para lá do oceano que afinal
não nos separa. Um indelével fio que nos continuará a unir, mesmo que não o
sintamos, desta forma clara e evidente, como o sentimos no decorrer destes
anos.
Isso
não esqueceremos.
A
borboleta bate asas no Japão e uma tempestade forma-se do outro lado do mundo.
Num sistema caótico, no planeta que habitamos, depois de algo ter mudado, não é
possível retornar ao ponto em que tudo começou. Só a estrela da manhã nos
continuará a indicar o sol nascente.