Poesia # 13 - O Poiso da Malta
O que vou contar passa-se num período longínquo, na cidade mais bonita do mundo: Luanda. Era a "jóia da coroa", o sítio de onde todos gostavam de dizer que estavam a chegar ou para onde estavam a ir; onde elas usavam mini-saias e nós não cortávamos o cabelo, numa guerra permanente com os "cotas". Foi quando se começou a ouvir música "não" comercial; quando as calças eram à boca de sino; quando os dias passavam como se tivessem sido feitos para nós, sempre cheios de algo que nos dava uma boa disposição permanente. E quando, inesperadamente, descobrimos que não tínhamos País.
O nosso "sítio" era na ponte do rio seco, que ficava ao lado da entrada do bairro. Por baixo, existia uma estrutura em betão que, em princípio, serviria para as águas das chuvas serem canalizadas para o mar. Não sei porquê, mas quando chovia, a Coreia do Sul ficava sempre soterrada com a areia que era arrastada do bairro do Prenda. Era um fenómeno que ninguém compreendia, mas que era aceite como uma coisa perfeitamente normal. Do lado de cá do rio seco, era a Coreia, a única que era realmente importante e que tinha a malta fixe. E o poiso da malta era a ponte, onde todas as tardes nos sentávamos, encostávamos as motas e "curtíamos". Sempre sem sermos "malaikos" [1]. Onde estavam sempre a acontecer "cenas".
Era um sítio fantástico. Víamos quem entrava e quem saía. Podíamos sempre ver se os "cocós" do costume continuavam iguais a si próprios; as miúdas passavam de propósito para nós sabermos onde estavam e elas ficavam a saber se estávamos ou não. Éramos ostensivamente desprezados por muitos. Os que tinham altas máquinas, mostravam-nas, às vezes com tentativas elaboradas de peripécias que acabavam em trambolhões. Os mais velhos que já tinham carro, passavam, mas não nos ligavam "puto" (ou fingiam), enfim… era o nosso observatório privilegiado do mundo. Tudo acontecia ali, tudo era combinado ali e era dali que saíam as excursões para as farras, umas a pé, outras de mota.
[1] Malaiko: Pessoa que não é "cool"