Olhar as coisas como elas são
Em frente à nossa residência foram há muito plantados meia dúzia de plátanos, uma das 60.000 espécies de árvores conhecidas em todo o Mundo. Foram transplantadas ainda pequeninas para aqueles espaços circulares que se abrem no meio dos passeios, onde ficaram a morar.
As árvores foram crescendo com os anos e uma delas, que fica defronte à janela do meu quarto, já atinge o 6º andar. Não é muito frondosa, mas tem um tronco robusto e um porte muito elegante. É lá que se recolhem os pássaros ao fim do dia, que aí constroem os ninhos e geram as suas famílias. É debaixo da sua sombra que os condutores procuram estacionar os carros em dias de calor e os ciclistas prendem as suas bicicletas ou trotinetes. Os cãezitos das redondezas raramente passam por lá sem deixar a sua assinatura odorífera e as pessoas pouco educadas por lá abandonam, às vezes, umas tralhas velhas.
Quando de manhã me levanto e abro a janela, ali está ela a olhar para mim. Ora serena e calma, ora farfalhando agitada pelo vento, dando-me de imediato a noção de que tipo de dia me espera. Gosto de a ver verde e pujante, mas também é linda quando as suas folhas se tornam de um amarelo nacarado. Depois, como se estivesse a lembrar-nos de que existe, deixa-as cair e espera que as vão limpar.
Antigamente quando olhava para ela, via somente a árvore. Agora, digo-lhe: bom dia! E fico-lhe grato por existir.
Como é possível que durante tantos anos eu só visse a árvore?
O meu plátano não tinha nome, mas a partir de agora chama-se...Valentina, porque hoje é dia de S. Valentim e só agora me lembrei de a baptizar.
É muito importante olharmos as coisas como na realidade elas são. Ver é superficial, enquanto o olhar é detalhado e profundo.
Desfrute por completo do ambiente envolvente. Encha o peito de ar fresco e medite um pouco. Passeie regularmente a pé.
Toque, cheire, mexa e sinta. Não passe só por passar!
Se for até à beira-mar, pise a areia, recolha uma ou outra concha, observe a delicadeza das suas linhas, cheire as rochas, as algas, os limos, ...
No interior, desfrute das paisagens, dos campos em bruto e dos semeados, da musicalidade das águas dos riachos, do cheiro dos eucaliptos, dos pinheiros, ou da beleza de uma amendoeira em flor.
Em Belas, onde jogo regularmente golfe com uns amigos, as perdizes que andavam em grupos familiares de 6 a 8 indivíduos agora, em tempo de acasalamento, passam por nós aos pares.
Também não admira, hoje é Dia dos Namorados!
Lisboa, 14 de Fevereiro de 2022
José Aleixo Dias (1)
(1) O autor escreve segundo o antigo acordo ortográfico