Objectos de prazer
A literatura e a música são duas das minhas paixões.
O livro é para mim algo de mágico. Foi uma das primeiras descobertas da pré-adolescência e nunca mais deixou de me encantar. Ler transportava-me para outros mundos, outras realidades, sonhava aventuras e deliciava-me com a história e nas histórias.
A música veio de seguida e ajudou a temperar um imaginário rico e variado, que tenho procurado cultivar até hoje. Com a minha mulher, que comunga dos mesmos interesses, reunimos uma extensa biblioteca literária e musical, com "resmas" de LPs e CDs. Claro que também temos acesso ao Spotify, mas não é a mesma coisa. Aqui os conteúdos situam-se algures, distantes, intocáveis e potencialmente inacessíveis nalgumas circunstâncias.
Não me basta ler e ouvir, gosto de saborear e de partilhar.
Dos textos que gosto muito fica-me um desejo de posse. Não basta conhecê-los, tenho de ter um exemplar. Depois leio, anoto, sublinho, aprecio, discuto e se gostar, recomendo.
Os meus livros estão arrumados mediante determinada ordem, que nem sempre consigo manter, pois a limpeza e dinâmica de consulta e empréstimo obriga a alguma rotação dos mesmos. Sei que devia ser mais desprendido em relação ao sentimento de posse mas, estes objectos são para mim como que tesouros, referências que não quero olvidar e de que me sirvo quando escrevo.
Se o conteúdo de um livro não me cativa nos primeiros capítulos, dou-o. Doar às vezes não é fácil por carência de receptores, mas ultimamente tenho encontrado forma fácil de os escoar. Por vezes acontece-me que me fazem falta quando já não os tenho ou não consigo encontrar, outras vezes (poucas) compro o mesmo livro que já tinha adquirido antes, seja porque é de outra edição e não o reconheci, seja porque a memória já me vai faltando. Também já me aconteceu doar uma enciclopédia, porque tinha outra mais actual e depois arrepender-me de o ter feito, por razões específicas ou sentimentais.
Mantive durante anos colecções de cromos, cadernetas, dossiers com recortes de jornais, fotos, revistas, bilhetes de entrada em espectáculos e cerimónias, mas um dia perguntei-me: para quê? Desisti de muitos destes objectos, mas dos livros e discos, não consigo. Hão-de acompanhar-me até à minha partida.
Sim, sei que hoje posso aceder ou guardar quase tudo isto de forma electrónica, digital, ou consultá-los na net. Só que aí, que eu saiba, ainda não adquirem patine nem se podem acariciar.
Lagos, 25 de Setembro de 2022
José Aleixo Dias(1)
(1) o autor escreve segundo o anterior acordo ortográfico