Nervos
Estou a jantar num restaurante de praia.
Numa mesa à minha frente, um homem magro de cabelo grisalho não pára de roer as unhas. Depois, bate no topo da mesa com as pontas dos dedos, enquanto abana lateralmente as pernas cruzadas. Está nisto há largos minutos.
Todo o processo é demasiado evidente e incomodativo, pois reparo que outros clientes também se focam naquela mesa.
Quero crer que neste momento já estará a "roer os dedos", dada a intensidade e frequência com que o faz.
Fala pouco e baixo (imperceptível à distância que me encontro), mas gesticula e sorri muito, não disfarçando a sua inquietação.
A mão esquerda passou agora para os talheres, que ajusta e separa alternadamente.
Chega, entretanto, o couvert, mas não se serve.
Continua a manusear os objectos que estão em cima da mesa e que incluem também, um telemóvel que ocasionalmente consulta.
Agora é o copo o motivo da sua atenção. Olha-o fixamente, fá-lo girar sobre si próprio e depois, com o dedo médio, percorre lentamente o seu bordo molhado, como que a fazê-lo soar.
Deitam-lhe um pouco de vinho branco, que agradece com um aceno positivo da cabeça, brindando de seguida com os outros convivas.
Depois, volta a "ratar" as pontas dos dedos da mão direita, enquanto acerta os talheres com a esquerda.
Ergue agora o copo de vinho e bebe um trago.
Entretanto, todos os outros parceiros de mesa se deleitam com sardinhas assadas, mas ele continua com o prato vazio, movimentando o copo em pequenos círculos, enquanto agita as pernas. Não come nada.
E eu?
Bom ! É melhor que coma o que me puseram à frente. Senão, ainda começo a roer as unhas!...
Lagos 17 de Agosto de 2022
José Aleixo Dias (1)
(1) O autor escreve segundo o anterior acordo ortográfico