Musicando 2
Na minha infância e juventude nunca tive gira-discos nem leitores de cassetes. A única música que ouvia era na rádio, onde a Emissora Nacional dava o "Serão para Trabalhadores" e o "Discos Pedidos'' e, muito mais tarde, na televisão.
Eu e as minhas primas fazíamos concursos, cantando os êxitos da altura, principalmente portugueses.
Só me eduquei musicalmente quando fui viver com os meus tios, em Cascais. Lembro-me que o meu tio Carlos, o meu segundo pai, adorava a "Carmina Burana" e a música brasileira. Foi também em Cascais que contactei com o Jazz.
Completei o percurso com o meu marido, com centenas de LPs dos melhores cantores e bandas, principalmente estrangeiras. Fomos a Londres ao concerto do Joe Bonamassa no Albert Hall. Tocou com a cantora Beth Hart; tenho pena que nunca tenham vindo a Portugal.
Mau! Mau! O meu objetivo é falar dos meus preferidos da Música Portuguesa.
Embora o Fado tenha sido declarado pela Unesco Património Imaterial da Humanidade, gosto de muitos fadistas, já fui muitas vezes ouvir a casas de fado, no entanto, não estou fadada para ouvir fado todos os dias. Falta a varinha de condão!
Claro que a Grande Amália é imortal, também apreciava o Alfredo Marceneiro e a sua voz rouca, inconfundível, e o Carlos do Carmo com o fado-canção. O meu fado preferido é o "Embuçado":
(...)
"E ante a admiração geral
Descobriu-se o embuçado
Era el-rei de Portugal, houve beija-mão real
E depois cantou-se o fado"
Da nova geração gosto da Marisa e do Camané e das cantoras mais jovens não consigo decidir.
Há uns cinco anos, fomos à F.C. Gulbenkian ver um espectáculo de Os Músicos do Tejo denominado Fado Barroco. Adorei! O grupo é excepcionalmente original. Um dos solistas, penso que é o Ricardo Ribeiro, cantou uns trechos que se assemelham muito à música cigana.
Os Músicos do Tejo são um conjunto instrumental de música antiga fundado em 2005 por Marcos Magalhães (cravista e diretor musical) e Marta Araújo (cravista e diretora), hoje com projeção internacional.
"O disco "As Sementes do Fado" obteve 4 estrelas (em 5) no jornal "Público" - Ipsílon e foi considerado pelos críticos do JL como um dos melhores discos nacionais do ano de 2007." É uma viagem às origens do fado. O resultado é excepcional! O objetivo é abordar diferentes vertentes da música em Portugal entre os séculos XVI e XVIII.
Aconselho vivamente esta "orquestra"!!!
Esqueci-me do Fado de Coimbra, onde estudei! É lindo!
"O Fado de Coimbra é uma expressão musical única no mundo. Tocado e cantado pelos estudantes da Universidade é, segundo a tradição, protagonizado somente por homens. Do mesmo modo, para tocar e cantar Fado de Coimbra é preciso envergar a capa, que deve estar traçada." Canta-se à noite, quase às escuras, em praças ou ruas da cidade. Os locais mais típicos são as escadarias do Mosteiro de Santa Cruz e da Sé Velha. Os poemas evocam, invariavelmente, o amor e a saudade por uma mulher, pela cidade e pela Academia.
Contrariamente ao Fado de Lisboa, das tabernas e das casas de fado, o Fado de Coimbra é, na sua essência, um fado de serenata, com letras e músicas, não só de raiz popular, mas também de origem erudita, tendo sido musicados poemas dos mais ilustres poetas que passaram pela Universidade de Coimbra. A caixa da Guitarra (viola) de Coimbra é maior do que a de Lisboa, é afinada num tom abaixo e a voluta é em forma de lágrima.
Dos cantores ditos "clássicos", destaques para Augusto Hilário, António Menano, Edmundo Bettencourt e Luiz Goes.
No entanto, nos anos 50-60 do Século XX, iniciou-se um movimento que levou os novos cantores a optar por grandes poetas, clássicos e contemporâneos, como forma de resistência à ditadura de Salazar. Neste movimento destacaram-se nomes como Adriano Correia de Oliveira e Zeca Afonso.
No que respeita à guitarra portuguesa, Artur Paredes (pai de Carlos Paredes) revolucionou a afinação e a forma de acompanhamento do fado de Coimbra, associando o seu nome aos cantores mais progressistas e inovadores.
Fado Hilário, Do Choupal até à Lapa, Balada da Despedida ,"Coimbra tem mais encanto, na hora da despedida", O meu menino é d'oiro, Samaritana, Fado do Estudante - são alguns dos mais conhecidos fados de Coimbra.
Curiosamente, não é um fado de Coimbra, mas uma canção, o mais conhecido tema sobre aquela cidade: Coimbra é uma lição, que teve um êxito assinalável em todo o mundo com títulos como Avril au Portugal ou April in Portugal.
O meu Pai adorava e cantava muitas vezes "O meu menino é d'oiro" do Zeca Afonso.
O meu menino é d'oiro
É d'oiro fino
Não façam caso que é pequenino
Não façam caso que é pequenino
(...)
Venham altas montanhas, ventos do mar
Que o meu menino nasceu pra amar
Que o meu menino nasceu pra amar (...)
Um dos Fados mais famosos é Samaritana, letra e música de Álvaro Cabral ou de Edmundo Bettencourt?
Dos amor's do Redentor
Não reza a História Sagrada
Mas diz uma lenda encantada
Que o Bom Jesus sofreu d'amor.
Sofreu consigo e calou
Sua paixão divinal,
Assim como qualquer mortal
Que um dia d'amor palpitou. (...)
Maria de Lurdes Aleixo
Fontes: https://www.rfi.fr/br/africa/20101026-sementes-do-fado; https://www.cm-coimbra.pt/areas/visitar/7-razoes-para-visitar/3-fado-de-coimbra; https://www.letras.com.br/fado-de-coimbra/biografia; https://www.letras.com.br/fado-de-coimbra/biografia