Musicando 2 

23-06-2022

Na minha infância e juventude nunca tive gira-discos nem leitores de cassetes. A única música que ouvia era na rádio, onde a Emissora Nacional dava o "Serão para Trabalhadores" e o "Discos Pedidos'' e, muito mais tarde, na televisão.

Eu e as minhas primas fazíamos concursos, cantando os êxitos da altura, principalmente portugueses.

Só me eduquei musicalmente quando fui viver com os meus tios, em Cascais. Lembro-me que o meu tio Carlos, o meu segundo pai, adorava a "Carmina Burana" e a música brasileira. Foi também em Cascais que contactei com o Jazz.

Completei o percurso com o meu marido, com centenas de LPs dos melhores cantores e bandas, principalmente estrangeiras. Fomos a Londres ao concerto do Joe Bonamassa no Albert Hall. Tocou com a cantora Beth Hart; tenho pena que nunca tenham vindo a Portugal.


Mau! Mau! O meu objetivo é falar dos meus preferidos da Música Portuguesa.

Embora o Fado tenha sido declarado pela Unesco Património Imaterial da Humanidade, gosto de muitos fadistas, já fui muitas vezes ouvir a casas de fado, no entanto, não estou fadada para ouvir fado todos os dias. Falta a varinha de condão!

Claro que a Grande Amália é imortal, também apreciava o Alfredo Marceneiro e a sua voz rouca, inconfundível, e o Carlos do Carmo com o fado-canção. O meu fado preferido é o "Embuçado":

(...)

"E ante a admiração geral

Descobriu-se o embuçado

Era el-rei de Portugal, houve beija-mão real

E depois cantou-se o fado"


Da nova geração gosto da Marisa e do Camané e das cantoras mais jovens não consigo decidir.

Há uns cinco anos, fomos à F.C. Gulbenkian ver um espectáculo de Os Músicos do Tejo denominado Fado Barroco. Adorei! O grupo é excepcionalmente original. Um dos solistas, penso que é o Ricardo Ribeiro, cantou uns trechos que se assemelham muito à música cigana.

Os Músicos do Tejo são um conjunto instrumental de música antiga fundado em 2005 por Marcos Magalhães (cravista e diretor musical) e Marta Araújo (cravista e diretora), hoje com projeção internacional.

"O disco "As Sementes do Fado" obteve 4 estrelas (em 5) no jornal "Público" - Ipsílon e foi considerado pelos críticos do JL como um dos melhores discos nacionais do ano de 2007." É uma viagem às origens do fado. O resultado é excepcional! O objetivo é abordar diferentes vertentes da música em Portugal entre os séculos XVI e XVIII.

Aconselho vivamente esta "orquestra"!!!

Esqueci-me do Fado de Coimbra, onde estudei! É lindo!

"O Fado de Coimbra é uma expressão musical única no mundo. Tocado e cantado pelos estudantes da Universidade é, segundo a tradição, protagonizado somente por homens. Do mesmo modo, para tocar e cantar Fado de Coimbra é preciso envergar a capa, que deve estar traçada." Canta-se à noite, quase às escuras, em praças ou ruas da cidade. Os locais mais típicos são as escadarias do Mosteiro de Santa Cruz e da Sé Velha. Os poemas evocam, invariavelmente, o amor e a saudade por uma mulher, pela cidade e pela Academia.

Contrariamente ao Fado de Lisboa, das tabernas e das casas de fado, o Fado de Coimbra é, na sua essência, um fado de serenata, com letras e músicas, não só de raiz popular, mas também de origem erudita, tendo sido musicados poemas dos mais ilustres poetas que passaram pela Universidade de Coimbra. A caixa da Guitarra (viola) de Coimbra é maior do que a de Lisboa, é afinada num tom abaixo e a voluta é em forma de lágrima.

Dos cantores ditos "clássicos", destaques para Augusto Hilário, António Menano, Edmundo Bettencourt e Luiz Goes.

No entanto, nos anos 50-60 do Século XX, iniciou-se um movimento que levou os novos cantores a optar por grandes poetas, clássicos e contemporâneos, como forma de resistência à ditadura de Salazar. Neste movimento destacaram-se nomes como Adriano Correia de Oliveira e Zeca Afonso.

No que respeita à guitarra portuguesa, Artur Paredes (pai de Carlos Paredes) revolucionou a afinação e a forma de acompanhamento do fado de Coimbra, associando o seu nome aos cantores mais progressistas e inovadores.

Fado Hilário, Do Choupal até à Lapa, Balada da Despedida ,"Coimbra tem mais encanto, na hora da despedida", O meu menino é d'oiro, Samaritana, Fado do Estudante - são alguns dos mais conhecidos fados de Coimbra.

Curiosamente, não é um fado de Coimbra, mas uma canção, o mais conhecido tema sobre aquela cidade: Coimbra é uma lição, que teve um êxito assinalável em todo o mundo com títulos como Avril au Portugal ou April in Portugal.

O meu Pai adorava e cantava muitas vezes "O meu menino é d'oiro" do Zeca Afonso.


O meu menino é d'oiro

É d'oiro fino

Não façam caso que é pequenino

Não façam caso que é pequenino

(...)

Venham altas montanhas, ventos do mar

Que o meu menino nasceu pra amar

Que o meu menino nasceu pra amar (...)


Um dos Fados mais famosos é Samaritana, letra e música de Álvaro Cabral ou de Edmundo Bettencourt?


Dos amor's do Redentor

Não reza a História Sagrada

Mas diz uma lenda encantada

Que o Bom Jesus sofreu d'amor.


Sofreu consigo e calou

Sua paixão divinal,

Assim como qualquer mortal

Que um dia d'amor palpitou. (...)


Maria de Lurdes Aleixo


Fontes: https://www.rfi.fr/br/africa/20101026-sementes-do-fado; https://www.cm-coimbra.pt/areas/visitar/7-razoes-para-visitar/3-fado-de-coimbra; https://www.letras.com.br/fado-de-coimbra/biografia; https://www.letras.com.br/fado-de-coimbra/biografia