Jaquinzinhos fritos
Tinham deixado o quartel ao romper d'Alva.
Vinham num exercício de recruta com farda nº2 e espingarda nas mãos, quando se aproximaram daquele túnel.
Havia horas que percorriam campos e estradas, tendo para saciar a sede apenas a água clorada do cantil.
Estava muito calor naquele final de manhã e os estômagos aceitariam de bom grado qualquer bebida ou alimento que lhes caísse nas bocas secas.
Ouviam o eco cadenciado dos seus passos naquela galeria, quando um aroma característico os fez salivar: cheirava a carapaus fritos!...
Primeiro o Jeremias, depois o Francisco, um e outro desenfiados da formatura não resistiram ao apelo do estômago e de tão apetitosas emanações.
O Sargento que os comandava acabou por condescender, face à exaustão, às características do local (meio esconso) onde se encontravam e ao apetite que lhes devorava as entranhas.
Num ápice, uma nuvem verde-acastanhada de fardas e bonés cercou a porta da tasca.
As armas, ensarilhadas em grupos de três ou quatro de coronha no chão, formavam pequenas moitas bélicas.
Um a um, colocados em cima de fatias de pão, os carapauzinhos começaram a alimentar aquelas bocas famintas e, pouco depois, também as gargantas sentiram a frescura de uma cerveja, ou a doçura aveludada de um copo de três.
Estavam já sentados a deliciarem-se com uma bica revigorante, quando vindo sabe-se lá onde, surgiu o Capitão Damasceno.
Num ápice correram para as armas, formaram alas e perfilaram-se perante o superior.
Este, caminhando para eles do alto das suas botas lustradas e de bengalim na mão, observou o estado da tropa e os despojos daquele repasto não programado.
Aproximando-se do balcão serviu-se igualmente de um carapau, deu-lhe umas trincadelas, enquanto enchia um copo de vinho.
Depois olhou para o grupo com um semblante carregado, mas condescendente, e disse:
- O que vos safa, é que os carapaus estão bons!
Lisboa, 13 de Outubro de 2022
José Aleixo Dias(1)
(1) o autor escreve segundo o anterior acordo ortográfico