À procura do Eu
Associamos, geralmente, um assessment a ferramentas utilizadas pelas empresas para avaliar competências comportamentais e cognitivas dos seus colaboradores. Conhecemos bem as diferentes lentes de observação que um assessment permite utilizar: questionário de auto-avaliação; questionário 360 em que se capta o feedback de chefias, pares e reportes; entrevista individual; dinâmicas de grupo, entre outras. Sabemos também que, para além de assessments ligados às organizações, há múltiplas outras áreas em que recorremos a este tipo de exercício, como seja na saúde, educação, ambiente ou risco.
Independentemente da área em que se aplica, um assessment visa determinar a importância ou o valor de algo. Para perceber o que isso significa, vale a pena começar por ir à origem da própria palavra assessment. Sabemos que tem origem no latim e mais concretamente na expressão: ad-sedere (to sit, em inglês) e que deu origem à palavra assidere (sit by, também em inglês). Assidere, em latim, deu depois origem a Assesser (Francês antigo) e Assess (inglês).
Parece-me muito interessante a origem da palavra e o conceito que, subsequentemente, dela decorre. De "sentar" (to sit) passamos para "sentar para" (sit by) ou, numa interpretação mais livre, "sentar com". Já não é o mero "sentar" ou "sentar-me", mas sim sentar com um determinado objetivo. Gosto de pensar que na origem de assidere esteja a ideia de "sentar-me junto de". Parece-me que o ato de sentar, na aceção de assidere, tem como propósito a construção de uma relação que parece apontar para o "outro" (alguém que está sentado ao meu lado ou ao lado de quem eu me sento). Mas, este "sentar-me junto" ou "sentar-me com" pode também significar "sentar-me comigo próprio".
Em processos de transição, pessoal ou profissional, é importante encontrar tempo para nos "sentarmos connosco próprios" e, desta forma, fazermos o nosso assessment pessoal. Podemos fazê-lo nas diferentes dimensões da nossa vida:
Como tem sido a minha carreira?
O que são as minhas principais qualidades e as principais áreas de melhoria?
De que forma tenho colocado essas qualidades ao serviço dos outros?
De que forma é que a minha "desatenção" a algumas áreas de melhoria tem influenciado a minha vida?
Que julgamento faço de mim próprio enquanto colega, Pai/Mãe, filho/filha, cidadão/cidadã?
O que pretendo fazer enquanto me preparo para a reforma?
Qual o sentido da minha vida agora que estou reformado?
Todos estamos de acordo que o Mundo nunca mais será igual depois do COVID 19. Ninguém consegue prever a dimensão e duração dos efeitos desta pandemia na Economia, mas todos sabemos que será um enorme tsunami que nos vai testar, uma vez mais, aos limites. Parece-me, pois, ser este o momento para agarrarmos esta ferramenta (assessment) e pararmos para avaliar o que fomos até hoje, o que estamos a ser no presente e o que ambicionamos ser no futuro.
Entre o turbilhão de e-mails, as reuniões com colegas e clientes à distância e algumas de novo presenciais, as tarefas familiares num confinamento que nem sempre foi fácil e muitas vezes foi ruidoso, mas também no regresso que muitos já estão a fazer aos escritórios é importante encontrarmos um momento diário só para nós próprios em que possamos fazer um self-assessment.
Sendo um defensor de uma sociedade de "portas abertas e sem muros", creio que é importante termos tempos para "fecharmos à chave as nossas portas exteriores" e, ainda que por breves momentos, ficarmos isolados de tudo e de todos; não com a intenção de nos fecharmos aos outros ou de deixarmos de estar disponível para quem precisa de nós, mas para encontrar momentos em que ninguém nos interrompe os pensamentos ou "viola o nosso espaço pessoal". Muitos de nós só conseguiremos fazê-lo já tarde noite dentro, quando a casa adormeceu, ou bem cedo de manhã, ainda antes de o sol nascer.
Se conseguirmos fazer o nosso próprio assessment, encontraremos certamente respostas a dúvidas e inquietações que temos.
Se conseguirmos fazer o nosso próprio assessment, encontraremos soluções para problemas que nos pedem para resolver.
Se conseguirmos fazer o nosso próprio assessment, conseguiremos tomar decisões sobre assuntos que temos vindo a adiar.
Se conseguirmos fazer o nosso próprio assessment, abriremos portas à nossa capacidade de criar e inovar.
Se conseguirmos fazer o nosso próprio assessment, perceberemos melhor onde podemos ter um impacto positivo na vida dos outros.
Se conseguirmos fazer o nosso próprio assessment, estaremos mais bem preparados para gerir o processo de transição.
Se conseguirmos fazer o nosso próprio assessment, a nossa reforma poderá ganhar outro sentido e dimensão.
Quando conseguirmos fazer o nosso próprio assessment, estaremos mais bem preparados para os desafios que nos esperam.
Quando conseguirmos fazer o nosso próprio assessment, estaremos a construir um futuro, para nós e para os outros, mais promissor e radioso.
Diogo Alarcão
Artigo opinião - Março 2020
(Adaptado para a TRANSIÇÕES em Novembro 2021)